quinta-feira, 7 de maio de 2009

O insustentável.

A felicidade reside nos pequenos momentos, lembrava. Quando os pensamentos se apossavam dela sorrateiramente, a menina podia sentir, ouvir, ser-tocar o tempo, naquela aparente boba e pequena fração de instante em que os infinitos copos de melancolia cabiam num sorriso.
É isso, ela sorria, sorria oras, e disse com os olhos brilhantes:

"Há muito tempo meu coração não ficava tão leve".

E de tanto almejar a leveza e falar nela, a menina ficou mais leve que o ar. Seu corpo era luz, seu peito explodia em cores, ela subitamente se tornara um espectro que ia esmorecendo, se dissolvendo no ar...


Enquanto evaporava até o céu, um trecho se repetia em sua cabeça:
"Einmal ist keinmal. Uma vez não conta. Uma vez é nunca. A história da Boêmia não vai se repetir uma segunda vez, nem a história da Europa. A história da Boêmia e a história da Europa são dois esboços que a inexperiência fatal da humanidade traçou. A história é tão leve quanto a vida do indivíduo, insustentavelmente leve, leve como uma pluma, como uma poeira que voa, como uma coisa que vai desaparecer amanhã."

Sentia-se apática. Não via sentido nas coisas. Não sabia mais identificar os dias da semana. Com os olhos secos via as cores borradas a se misturar: sua distância do mundo a fascinava e assustava. Por vezes se desconectava da realidade: seria isso sinal de loucura?

E aguardava o dia em que sua alma seria precipitada de volta às profundezas do mar. E em que faria um bonito arco-íris.